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No dia 9 de março, Brasil, Argentina e El Salvador lançam programa de formação em Agricultura Resiliente ao Clima
Norma Ramirez, agricultora familiar do município de Berlín, em El Salvador, já tem em mente uma das coisas que quer aprender na formação que fará este ano sobre resiliência climática. “Gostaria que nos proporcionassem capacitação sobre a agricultura orgânica para que eu tenha mais conhecimento. E também como fazer para que não falte água para nossos cultivos.” Berlín é um dos municípios de El Salvador que está dentro do Corredor Seco, território com clima subúmido que corta cinco países da América Central.
Em direção ao sul da América Latina, mais precisamente no departamento de Santiago del Estero, na região do Chaco, no norte argentino, Dora Corvalán anuncia sua expectativa com relação ao mesmo programa de formação que a salvadorenha Norma está inscrita.
“Que possa criar capacidades em nossos jovens, em nossas organizações para a gestão, para a correta gestão dos recursos naturais. Que possamos aprender a partir de outras experiências e colocar este conhecimento em prática adaptando-o à realidade de cada lugar, cada território”, sustenta ela, acrescentando que também espera uma boa adesão dos jovens: “Acho que isto criará mais raízes se eles puderem se apropriar deste programa de formação.
Em mais uma região semiárida da América Latina, Raquel de Castro, uma jovem da etnia dos Tremembé, que mora nas terras indígenas da Barra do Mundaú, no estado do Ceará, também está motivada a participar da formação. “Quero intensificar ainda mais essa agricultura agroecológica sustentável, que já vem sendo trabalhada dentro do território de forma individual e coletiva, essa agricultura que só vem a fortalecer ainda mais a terra com a diversidade de plantações. Acredito que essa formação vai me ajudar ainda mais a compreender e a trabalhar com os agricultores do meu território”, sustenta a jovem.
Norma, Dora e Raquel fazem parte do grupo de quase 1,3 mil pessoas inscritas no programa de formação em Agricultura Resiliente ao Clima, que será lançado um dia depois do Dia Internacional da Mulher, nesta quarta-feira (9), das 13h às 14h30 (horário de Brasília).
O evento será transmitido via Youtube do Instituto Nacional de Tecnologia Agropecuária (INTA), ligado ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Pesca da Argentina. O INTA é a instituição responsável pelo suporte tecnológico ao ensino à distância.
Mulheres e mudanças climáticas - Estudos apontam que as mulheres e os jovens são os segmentos mais vulneráveis aos problemas trazidos com o aumento da temperatura do planeta. Historicamente, são eles que ficam nas áreas rurais secas, quando os homens migram em busca de trabalho em outras regiões.
"O problema não é só elas ficarem com o com problema. É como elas estão preparados para lidar com o problema. Porque elas não têm a tomada de decisão, elas não têm o conhecimento e as variações climáticas extremas e o uso do solo estão deixando essas terras improdutivas. Então, se ela depende da sua subsistência dessa área, ela vai ter que a migrar para outras áreas. O conhecimento tem que ser melhor direcionado para a questão do problema. Nesta questão, a mulher é a solução", salienta o professor Humberto Barbosa, metereologista e doutor em Solo, Água e Ciências Ambientais pela Universidade do Arizona, nos Estados Unidos, que coordenadou um capítulo sobre o impacto do aquecimento nos solos para um dos relatórios do IPCC, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas que busca compreender as mudanças climáticas em curso.
A formação faz parte do projeto DAKI Semiárido Vivo, uma iniciativa sustentada por duas grandes redes de organizações da sociedade civil que atuam nas áreas secas da América: Articulação Semiárido (ASA) (https://asabrasil.org.br/) e Plataforma Semiáridos (https://www.semiaridos.org/pt-br/).
As ações do DAKI são ancoradas por três organizações: no Brasil, a Associação Programa Um Milhão de Cisternas (AP1MC), entidade jurídica que representa a rede ASA. Na Argentina, a Fundação para o Desenvolvimento em Justiça e Paz (Fundapaz). E, em El Salvador, a Fundação Nacional para o Desenvolvimento (FUNDE). O apoio financeiro vem do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA), ligado às Organizações das Nações Unidas (ONU).
O programa de formação - Direcionado para quem cultiva alimentos em três regiões secas da América Latina, a formação em Agricultura Resiliente ao Clima tem como objetivo principal ampliar as capacidades das comunidades e das organizações de assistência técnica rural – seja da sociedade civil, seja dos governos – para enfrentarem as situações adversas cada vez mais comuns com o aquecimento do planeta: secas prolongadas, perda de produtividade do solo, avanço do processo de desertificação, tempestades, entre outros.
Esta formação, que começa em março e se estende até dezembro deste ano, é uma das respostas da sociedade civil à crise climática, que já modifica os regimes de chuva nas áreas com histórico de estresse hídrico.
Raízes territoriais e alcance continental – O programa de formação será realizado no ambiente virtual, através de estratégias de acesso à internet para superar os desafios e limites enfrentados por quem mora no campo para se conectar. E, ao mesmo, o programa estimula a formação ou fortalecimento de redes territoriais que trabalham com agricultura resiliente.
“Buscamos o enraizamento dos aprendizados não apenas nos participantes que estão participando diretamente das sessões educativas, mas também para as pessoas que vivem nestas comunidades, nestes territórios, os diferentes atores sociais, as organizações de referência. Ou seja: que todos possam beber um pouco da fonte rica que vai ser esta formação”, explica Rodica Weitzman, coordenadora do componente de formação do projeto DAKI Semiárido Vivo.
E continua: “A ideia que nós temos é que no final do programa estamos construindo o que a gente chama de redes territoriais e, cada vez mais, estas redes territoriais vão se ampliando, vão se fortalecendo e vão dando sustentabilidade para as ações previstas dentro de planos de ação em agricultura resiliente ao clima no âmbito territorial.”
Além de promover intercâmbios e estimular a formação de redes territoriais em torno de recursos e conhecimentos que fortalecem a prática agrícola diante dos reveses do clima, o programa de formação também tem um grande trunfo: o material pedagógico construído a partir das experiências práticas que permitem a convivência com o Semiárido.
Saiba mais sobre o programa de formação, aqui (https://semiaridovivo.org/1o-programa-de-formacao/)
Deslocando o centro do conhecimento - Na proposta pedagógica da formação, as experiências protagonizadas pelos povos dos campos são conhecimentos valiosos para que mais e mais comunidades e territórios se preparem para enfrentar os extremos climáticos e desenvolvam habilidades e capacidades necessárias para se manter no campo com qualidade de vida.
“Em via de regra se fala que o conhecimento válido é o sistematizado na academia. O DAKI está trabalhando com outra forma de conhecimento que aqui, no Semiárido brasileiro, é algo muito comum que a ASA tem trabalhado, que é o conhecimento a partir da prática", conta Antônio Barbosa, da ASA.
E continua: "Importante dizer que a prática parte, inclusive, da necessidade que leva à inovação. Então estamos falando de inovação camponesa, inovação dos povos para atender a necessidades comuns, simples, como acesso à água, manejo dos solos, manejo das florestas, manejo dos seus animais. É esse conhecimento prático que os agricultores constroem, as comunidades tradicionais, os povos indígenas fazem, que nós vamos estudar, pesquisar, discutir com quem produz este conhecimento, inclusive com agricultores, agricultoras, mas também com técnicos”.
Para influenciar políticas públicas - As ações do DAKI favorecem os intercâmbios de conhecimentos entre campesinos e técnicos. Estes sujeitos são, via de regra, invisibilizados nos debates públicos acerca de temas que os envolvem, principalmente, as mudanças climáticas. E, para o FIDA, é muito importante que o DAKI reúna diversos povos das áreas secas da América Latina.
“A gente quer que essa diversidade, os povos e as comunidades tradicionais e várias populações e segmentos da sociedade civil que, às vezes, não têm voz ou têm uma voz limitada, possam também ter uma ação concreta e participar da formação de políticas públicas e da formação de opinião no segmento de resiliência climática, que envolve várias dimensões e, por isso, é um assunto importante porque tem impacto econômico e social”, acrescenta Hardi Vieira, Oficial de Programas do FIDA.
Reportagem: Assessoria de Comunicação - DAKI Semiárido Vivo